quarta-feira, 29 de novembro de 2017

Origens da ÁRVORE DE NATAL




A ÁRVORE DE NATAL
Dom Marcos Barbosa

Programa "Encontro Marcado" levado ao ar pela Rádio Jornal do Brasil em 15/12/86


Muitas pessoas fazem (sobretudo aos padres) a pergunta de como nasceu a árvore de Natal. E muitos não saberão responder com exatidão, pensando ter acontecido com a árvore o mesmo que se passou com o ovo da Páscoa.

Símbolo de fertilidade e de vida nova entre os pagãos, o ovo foi tomado como símbolo da vida nova trazida pelo Cristo ressuscitado, que sai do túmulo como o pintainho , na alegria da Páscoa. É o caso de um folclore pagão batizado pelos cristãos que lhe deram novo conteúdo.
 Ora, não foi o que aconteceu com a árvore de Natal que já nasceu cristã, como Nossa Senhora, que não precisou de batismo... Pois a árvore de NATAL nasceu da fusão de dois ritos  populares surgidos no seio das famílias cristãs.


 O primeiro desses ritos é a árvore de Adão e Eva; o segundo, a pirâmide de Natal.


 Adão e Eva são comemorados como santos no calendário das Igrejas orientais, e a sua devoção espalhou-se também pelo Ocidente, sobretudo na altura do ano mil que está longe de ser um ano de pavor como pretendem versões posteriores... A Igreja latina, embora não tenha oficializado esse culto aos primeiros pais, permitiu, no entanto, que o mesmo se expandisse entre o povo. O que se fez rapidamente, pois eram muito comuns na Idade Média os nomes de Adão e Eva.

Assim os homônimos de ambos passaram a consagrar-lhes a vigília do Natal, que sugeria justamente o fim de uma era (o Pecado ) e o começo de outra (a Redenção). Entre as homenagens prestadas aos primeiros pais surgiu, no século XVI, o costume de erguer-se dentro de casa, uma árvore do Paraíso. Como isto tudo se passava na Alemanha, o jeito foi pendurar num pinheiro, única árvore que resiste ao inverno, as maçãs que guardavam para isso.

Ora, ao lado desse costume, ligado portanto a Adão e Eva e a vigília do Natal, havia outro, ligado ao Cristo e a própria festa do Natal. Consistia esse costume em acender-se velas (hoje iluminamos as ruas) para mostrar que chegara o Cristo, luz do mundo. Essas velas eram frequentemente suspensas num tronco de modo a formarem uma pirâmide de pontos luminosos , a cuja base se colocara o presépio (já introduzido por São Francisco de Assis ) e em cuja ponta se alçava uma estrela.

Assim, era quase impossível que os dois símbolos não se fundissem num só, sendo o símbolo de pecado absorvido pelo da graça, e o do velho Adão absorvido pelo de Jesus. A árvore do pecado se tornava a árvore da Vida, que também existia no Paraíso, e da qual o homem não pode comer após ter colhido o fruto da árvore do Bem e do Mal. As maçãs se transformaram em bolas para mostrar as crianças (e não só às crianças) a alegria e a doçura que o Salvador trouxe aos homens...

Tendo visto como nasceu, vejamos como cresceu a árvore de Natal, a ponto de atravessar os mares e chegar até nossos dias.

 No século XVIII ela se propagara como um bosque , por todo o sul da Alemanha, alastrando-se depois por todo o país no século XIX, logo adotada pelos povos eslavos. Sabe-se exatamente quando brilhou na França a primeira árvore de Natal: a Princesa Helena de Mecklembourg, tendo se casado como Duque de Orleans , leva para a França aquela árvore, como a Rainha, sua homônima, Santa Helena, trouxera de Jerusalém o madeiro da Cruz...


 A árvore de Natal deve merecer dos fiéis todo o carinho.


 Ela é o próprio Cristo, com sua luz, seus frutos, sua alegria, suplantando o pecado e a treva.

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Texto de D. Marcos Barbosa

Programa "Encontro Marcado" levado ao ar pela Rádio Jornal do Brasil em 15/12/86

O costume da Árvore de Natal é atribuído a Marinho Lutero, líder protestante que iniciou a rebelião contra a Igreja Católica Apostólica Romana.
 

D. Marcos Barbosa não o menciona por motivos óbvios...

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O programa "Encontro Marcado" era transmitido diariamente às 6h da manhã pela Rádio Jornal do Brasil. O apresentador , Dom Marcos Barbosa, era um monge beneditino, poeta e escritor. Foi membro da Academia Brasileira de Letras. Nascido em 12/09/1915, em Minas Gerais, veio a falecer em 05/03/1997, no Rio de Janeiro



sábado, 25 de novembro de 2017

Sobre racismo: ENTREVISTA de CÉSAR BENJAMIN ao jornal Estado de São Paulo, 21/11/2017




ENTREVISTA de CÉSAR BENJAMIN ao jornal Estado de São Paulo, 21/11/2017



– O senhor causou uma grande polêmica com o movimento negro por conta da sua última postagem. O senhor esperava toda essa repercussão?

– Faço esse tipo de alerta sobre os perigos da racialização da nossa sociedade desde a década de 1990 e desde então sou patrulhado. O problema só se agravou. Hoje leio nos jornais, rotineiramente, expressões como “o escritor branco Fulano de Tal”, “o cineasta negro Beltrano”, “o professor Cicrano, branco”. Naturalizamos a divisão racial dos brasileiros. Ninguém mais reage. Dizer que os brasileiros mudam de calçada quando veem uma criança negra na rua é uma ofensa ao nosso país. Essa histeria tem que ser contida. Alguém tem que dizer que isso é mentira.

– O que, exatamente, o senhor quis dizer quando afirmou que a "racialização do Brasil foi uma criação do Departamento de Estado dos Estados Unidos"?

– Há muitos anos amigos gaúchos pediram-me que os recebesse no Rio de Janeiro e os acompanhasse em uma reunião que teriam na sede da Fundação Ford, que ficava na Praia do Flamengo. Queriam verificar a possibilidade de obter algum financiamento para projetos de educação em áreas rurais. Fiquei chocado com o que vi. Os funcionários da Fundação disseram abertamente que só financiariam projetos que destacassem a questão racial no Brasil. Exigiram que eles mudassem todo o projeto que levaram. Estabeleci ali uma conversa tensa sobre isso. Um deles disse, para todos ouvirmos: “Temos 15 milhões de dólares e vamos provar que o Brasil é racista.” Entendi perfeitamente a mensagem.
Pensemos num computador. Ele tem um hardware, que são seus componentes físicos, mas para funcionar precisa de um software, um programa que lhe dá as instruções sobre o que fazer. Uma sociedade também tem componentes físicos, que são a sua infraestrutura, e componentes ideológicos, que organizam o comportamento das pessoas. A Fundação Ford, que é um braço do Departamento de Estado, mirou no coração do nosso software, o conceito de povo brasileiro. Acertou em cheio. Se não há povo brasileiro, o Brasil não vale a pena. Isso é parte da grande crise civilizatória que se abateu sobre nós e nos paralisa.

– O senhor acha que o Brasil é um país racista? Ou o senhor acha que vivemos uma democracia racial? Por quê?

– Há racismo no Brasil, assim como há em praticamente todo o mundo. Nunca usei e não conheço quem tenha usado a expressão democracia racial. Mas, ao contrário do que ocorre em vários outros países, o sistema de valores que a sociedade brasileira escolheu não legitima o racismo. Isso é muito importante. Um sistema de valores não descreve fielmente o que existe, mas aponta os caminhos que queremos seguir. Sinaliza uma trajetória desejada. Os americanos transformaram essa nossa grande virtude em hipocrisia. Adestraram uma geração de militantes que detesta o Brasil.

– Muitos argumentam que, em sua palestra no TED, a atriz Thais Araujo, ao dizer que as pessoas mudam de calçada quando vêm seu filho, estaria falando de forma simbólica, metafórica, sobre o racismo no Brasil. O senhor não viu desta forma?

– Eu não vi a palestra da atriz, por quem tenho grande afeto. O que me chamou a atenção não foi a palestra em si. Foi a quantidade de gente que replicou essa barbaridade nas redes sociais de forma completamente acrítica, como se fosse verdade literal: os brasileiros atravessam a rua quando veem uma criança negra. Francamente...

– As estatísticas mostram que a discriminação racial é um fato no país. Os negros são os mais pobres, os que mais morrem, os que mais são vítimas da polícia, a maior parte da população carcerária. O senhor discorda disso?

– Uma grande mentira só prospera se tiver alguma aderência à realidade. Há verdade em tudo o que você diz, embora essas estatísticas sejam, em geral, de péssima qualidade. Mas são verdades seletivas, que acabam servindo a uma grande mentira: o Brasil é o país mais racista do mundo... A maior parte da população negra foi escrava até quase o final do século XIX, há poucas gerações, e nossa mobilidade social não tem sido suficientemente grande para alterar posições historicamente constituídas. É um problema gravíssimo. Dedico minha vida a lutar contra ele. Mas a racialização não nos ajuda em nada. Só acrescenta mais um problema. E nos impede de ter uma aproximação amorosa em relação ao nosso próprio país.

– O que o senhor quis dizer com "quero que as raças se fodam"?

– O conceito de raças humanas, além de cientificamente inepto, é pérfido, é do mal. Foi criado para justificar o colonialismo e desde então só separa, destrói, discrimina, justifica desastres humanitários de grandes proporções. Eu não quero que o Brasil seja um país de “escritores brancos [ou negros]” e “cineastas negros [ou brancos]”. Quero que seja um país de escritores e cineastas.

– Como secretário de educação, que tipo de ação o senhor tem tomado para evitar a discriminação nas escolas?


– Pelo visto você foi capturada pela histeria racial, pois sua pergunta pressupõe que há discriminação em nossa rede, que você sequer conhece. Afinal, o Brasil é assim, não é? Lamento decepcioná-la, mas não conheço nenhum caso que possa confirmar isso. Nossa rede é um microcosmo do Brasil, profundamente miscigenada. Se aparecer racismo, ele será tratado como deve, como uma burrice e um crime. O racista é, antes de tudo, um burro. Achar, no século XXI, que as pessoas devem ser julgadas pela cor da pele é o fim da picada.


César Benjamin é secretário municipal do Rio de Janeiro, desde 01/01/2017