INTRODUÇÃO:
O artigo abaixo é estudo de desacertos que podem macular o regime democrático. Os autores miram no governo TRUMP, mas sua análise e advertências servem para o caso brasileiro _ e aqui acrescento: DESDE QUE A PESSOA NÃO ESTEJA TOLDADA pela cegueira ideológica ou falta de leitura, como se nota muito nas postagens do Facebook...
Quando vemos , de um lado , um candidato que quer legitimar nas urnas seu óbvio autoritarismo e de outro, um partido de viés de esquerda, mas populista e autoritário em seu cerne (basta ver o "controle social da mídia), a leitura deste artigo é de bom alvitre.
Espera-se que o eleitorado não embarque numa senda que, de um lado ou de outro, mais aberta ou sutil, poderá levar o país à NEGAÇÃO da DEMOCRACIA.
18 de setembro de 2018.
A AGONIA DE UM SISTEMA
(Texto do Ex-blog Cesar
Maia, 18 de setembro de 2018)
(Caio Sartori - O Estado
de S. Paulo, 16)
1. As leis e o texto
constitucional não bastam para a saúde de uma democracia. Para além de regras
oficiais, ela precisa de normas informais. A tolerância mútua – entender que o
adversário é legítimo e não deve ser aniquilado – é uma delas. A outra é uma
espécie de ‘reserva institucional’, ou seja, evitar o uso desenfreado de
instrumentos legais que possam desgastar a estabilidade democrática.
2. A análise feita pelos
professores de Harvard Steven Levitsky e Daniel Ziblatt em Como as
Democracias Morrem, recém-lançado pela editora Zahar, é o ponto
do texto que suscita maior reflexão no (e)leitor brasileiro.
3. Aqui, onde balas e
facas foram direcionadas a presidenciáveis, a tolerância está em baixa. E como
falar em reserva institucional quando dois presidentes sofreram impeachment em
menos de 30 anos? Não se trata, explica o livro, de concordar ou não com os impedimentos
constitucionais, mas de entender que afastar mandatários, mesmo com
prerrogativa legal, desgasta a convivência democrática.
4. Diagnóstico preciso do
atual modo de corrosão das democracias, o livro, sucesso nos EUA, joga luz
sobre como os autocratas destes tempos chegam ao poder: não por meio de
tanques, mas pelo voto. “O retrocesso
democrático hoje começa nas urnas”, escrevem. Em contextos de crise, esses
outsiders se apresentam como solução. Seu sucesso depende, na visão dos
autores, de um endosso do establishment. Evitá-los, portanto, passa pelo
oposto: a existência de partidos fortes e, se possível, unidos, capazes de
freá-los.
5. Orbán, na Hungria;
Putin, na Rússia; e Erdogan, na Turquia, são exemplos atuais citados pelos
analistas. Com ares de legitimidade, os três autocratas estabeleceram uma série
de medidas antidemocráticas, mas com maquiagens que disfarçam a real faceta. Aprovadas
num Legislativo submisso ou referendadas por um Judiciário aparelhado, sua
arbitrariedade é quase imperceptível ao cidadão comum, para quem o governo
direciona um discurso de aperfeiçoamento da democracia. Eis o perigo: as próprias
instituições são usadas para erodir o sistema.
6. Levitsky e Ziblatt
listam quatro pontos para identificar autoritarismo:
rejeição das regras democráticas;
rejeição das regras democráticas;
negação da legitimidade dos oponentes;
tolerância ou encorajamento da violência;
e propensão a restringir liberdades civis, inclusive da mídia.
Motivo maior da
existência do livro, Donald Trump se encaixaria em todas elas. Apesar de se
debruçarem sobre exemplos do mundo todo – incluindo os de Fujimori e Chávez no
lado de cá da América –, os autores não poderiam ter outro foco senão o
presidente americano. Como foi que um empresário com posicionamentos
autoritários chegou ao poder na maior democracia do mundo?
7. Considerados por
Levitsky e Ziblatt “guardiões da democracia”, os partidos americanos operaram
por séculos nas “salas enfumaçadas”, reuniões fechadas das quais participavam
os profissionais do jogo. Políticos de carteirinha, os dirigentes
evitavam a ascensão de demagogos. Assim foi com Henry Ford, em 1924,
inviabilizado na disputa do Partido Democrata apesar de desfrutar de imensa
popularidade. O processo que culminou com Trump como presidente teria começado
em 1972, quando as primárias dos partidos passaram a contar com maior
participação de outros atores, numa busca por aumentar a interação popular nas
nomeações. Desde então, o número de outsiders nas primárias aumentou. No
entanto, eles costumavam ficar pelo caminho. Até que veio Trump.
8. A escalada do atual
mandatário pode ser entendida, entre outros fatores, como uma história de
“guarda ineficaz dos portões” republicanos. Em meio a novas regras de
financiamento e com a transformação midiática, o hoje presidente passou como
azarão pela “primária invisível”, etapa de consolidação de apoios, cresceu nas
primárias e chegou, enfim, à disputa contra Hillary Clinton.
9. Foi na eleição principal, na
visão dos autores, que os republicanos falharam em um ponto essencial: a união
em torno da candidatura democrática, apesar de discordâncias. Com a maioria dos
quadros de peso do partido neutros ou endossando Trump, a disputa não aparentou
ser uma crise, e sim uma “disputa bipartidária padrão.”
10. Testada a todo
momento por Trump, a democracia americana tem sobrevivido pelas instituições
fortes e a cultura de freios e contrapesos: regras não escritas que
complementam a Constituição. Basta ver a resistência dos democratas em
apoiar seu afastamento, mesmo com todos os escândalos, e dos próprios
republicanos em apoiar medidas extremas, como aparelhar o FBI. A
Hungria, Rússia e Turquia dos autocratas não têm essa capacidade de
sobrevivência institucional.
11. Primordial para os
nossos tempos, Como as Democracias Morrem é, em muitos momentos, uma ode aos
partidos e às normas informais de convívio democrático, capazes de evitar “um
combate institucional cujo objetivo é derrotar permanentemente os rivais
partidários.” O Brasil não está entre os países analisados a fundo no livro –
bom sinal, imaginemos. Cabe ao leitor, a partir da riqueza das informações
oferecidas por Levitsky e Ziblatt, avaliar o que há de parecido e de diferente
com as nações que estão em alerta.
12. Em novo livro,
professores de Harvard veem padrões entre as democracias acossadas por
autoritários, como a Hungria, Turquia, Rússia e Estados Unidos.
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